– Venha, estamos quase lá! – disse com sua voz excitada e estridente de sempre.
Suas tranças roçavam nos galhos sobressalentes das densas matas à sua volta, conforme avançavam no terreno lamacento.Protestos não adiantavam quando Poliana colocava alguma ideia na cabeça. Nunca.
– Mas Poli… já andamos bastante, eu tô cansado…
Suas pequenas sombras movendo-se rapidamente pelo verde morno da paisagem da chuva de verão espantavam pequenos animais, que voltavam correndo para seus esconderijos, um protesto contra a invasão dos dois. O ar ali dentro era doce e abafado, denso e tão úmido que parecia pastoso ao respirar. “Como respirar água” pensou Bruno, e não estava muito longe da verdade.
Rodelas de suor apareceram embaixo de seus braços e na gola das camisetas do acampamento, transformando o vermelho vivo da roupa em cor de sangue coagulado. O caminho agora se tornava um pouco mais difícil, o que exigia uma redução na marcha. Bruno mal terminou de agradecer àquele pequeno favor quando iniciaram uma série de saltos sobre raízes nodosas e retorcidas, que beiravam um tímido filete de água, vacilante sobre as pedras do leito rebaixado.
– Vê? Já chegamos no riachinho. Só mais um pouco agora.
– Ahhhh…Acho que fui picado! Droga, como coça!
– Falei pra você passar repelente seu imbecil. Depois a cabeça-de-pedra sou eu, né?
– Não gosto daquilo. É melequento e depois a pele fica grudando… ei, acha que a Dona Mercedes não vai dar por nossa falta?
– Não to nem aí. Se ela falar qualquer coisa digo que estávamos passando mal por causa daquela carne estranha que teve no almoço.
– Ah, isso eu duvido. Você não teria coragem de dizer que…
– Ali!
À frente, a mata se abria em pontos dourados e eles podiam ver a redoma verde-acinzentada que cobria o pequeno lago, permeada por raios preguiçosos de final de tarde. Árvores imponentes, curvadas em sua sabedoria sobre águas escuras e aparentemente bastante geladas.
– Não vamos entrar aí, né? – Perguntou o garoto receoso – Deve estar um gelo Poli!
– Claro que não, viemos VER uma coisa. Vem aqui.
Daquele ponto tinham a nítida impressão que a água se movimentava de maneira estranha: formava pequenas ondas em direção ao centro do lago, desafiando todas as leis da física. Deram a volta pela margem viscosa, os tênis afundando mais da metade na terra fofa e molhada, até uma pequena plataforma lamacenta que havia mais à direita de onde entraram. Neste instante um silvo grave de uma cigarra gorda e preguiçosa invadiu a clareira.
O som parecia se propagava em slow-motion, uma sirene submersa gritando um aviso. Sob o canto da cigarra seguiram mais alguns metros pelo píer, até que um alto estalo seguido de um grito fez Poliana estacar, assustada. Virou-se rápido e embaixo da raiz espessa que acabara de pular viu o pé de Bruno virado num ângulo estranho em relação à perna. Não havia sangue ou cortes, mas o garoto parecia estar sentindo muita dor.
– Ai, ai, aaaaaaaaai meu pé! – gritava, tentando arrancar a raiz que, obviamente, não cedia.
– Para Bruno… não se mexe… fica parado! – imagens de um livro de primeiros socorros que havia visto no ano anterior, durante um acampamento, lhe vieram à mente, todas ao mesmo tempo.
– Mas tá doendo! – disse choramingando. Lágrimas nos olhos – Tá doendo muito!
– Eu sei que deve tá doendo, mas não se mexe, pode piorar.
Analisou a raiz que prendia o pé do amigo: não conseguiria arrancá-la ali onde tropeçara, teria que ser em algum lugar onde fosse mais frágil, mais fina. Seguiu a extensão da planta entrando na água poucos metros adiante. Ali certamente conseguiria, ao menos, levantá-la.
– Que droga Poli. Ai! O que a gente tá fazendo aqui afinal? Aaaaai meu pé.
– Você disse que queria vir. Lembra?
– Eu sei, mas… aaaau! O que tá fazendo?
– Quieto, to tentando te soltar.
– Vai devagar aí. Ai. Eu disse que queria vir com você porque não queria te deixar sozinha. Imagina se acontece isso com você? Já pensou? – disse, apontando o próprio pé. – Aiiiii!
Aquilo havia sido a coisa mais bonita que tinha alguma vez ouvido do amigo. Não conseguiu pensar em nada adequado para dizer. Corou, deu uma risadinha embaraçada e continuou tentando levantar a raiz. Estava obtendo um sucesso razoável.
– Afinal, qual é a do lago?
– Nem sei se é verdade, seu bobo. As meninas da quinta série falam que dá pra ver o futuro nele, ou coisa assim.
– E você acredita nisso, bocó?
Poli dá um puxão mais forte e finalmente consegue levantar a raiz o suficiente para soltar o pé do amigo. Coloca uma pedra para escorá-la enquanto cuidadosamente ajuda Bruno a se levantar.
– Vem, apoia em mim.
– Ai. Devagar. Você não respondeu.
– O que?
– Se acredita nelas. Nas meninas.
– Não sei. – deu de ombros. Não sei nem se quero acreditar. Algumas coisas são mais importantes que o futuro, não acha? Vem, vamos embora, precisamos cuidar desse pé.
– Tá. Mas devagar, hein? – e viraram as costas para voltar.
E naquele instante, quem olhasse para a superfície fria e lodosa do lago, um espelho calmo e perfeitamente polido, veria a imagem dos dois amigos se abraçando num prelúdio de uma longa amizade.
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